França e Rússia disputam parcerias em novo plano brasileiro de defesa
Daniel Rittner, De Brasília - 28/07/2008
Ministro Mangabeira Unger, sobre a ampliação de gastos: "Nada é mais
caro do que ter independência nacional" .
Às vésperas de o Brasil lançar um ambicioso plano de defesa, cujo
anúncio parcial está previsto para 7 de setembro, representantes da
França e da Rússia intensificam seus contatos com o governo brasileiro
para acertar os ponteiros de uma "parceria estratégica" no setor. O
novo secretário do Conselho de Segurança da Rússia, Nikolai Patrushev,
estará hoje em Brasília para discutir temas como o desenvolvimento
conjunto de um veículo lançador de satélites (VLS) e a transferência
de tecnologia para a construção de caças supersônicos.
Na semana passada, foi o almirante francês Edouard Guillaud, principal
assessor para assuntos militares do presidente Nicolas Sarkozy, quem
percorreu gabinetes da capital para especificar os pontos de uma
associação com o Brasil.
"Estamos construindo parcerias que talvez não tenham precedentes",
afirmou ao Valor o ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos,
Mangabeira Unger. Paralelamente, o ministro da Defesa, Nelson Jobim,
percorre até quarta-feira uma série de bases militares americanas.
Jobim viajou acompanhado dos comandantes da Marinha, Júlio Soares de
Moura Neto, e da Aeronáutica, Juniti Saito, além do embaixador dos
Estados Unidos no Brasil, Clifford Sobel.
Há poucas possibilidades de uma associação mais ampla, no entanto,
devido às resistências americanas em trocar conhecimentos e transferir
tecnologia de seus equipamentos para outros países - uma pré-condição
sempre ressaltada por Mangabeira e Jobim.
A preparação do Plano Estratégico de Defesa formula seis hipóteses
para o uso das Forças Armadas e define como reconstruí-las, segundo
Mangabeira. Para o Exército, deverá haver indicações de reformas
estruturais. Hoje, conforme explica o ministro extraordinário, somente
10% do contingente é composto por forças de ação estratégica rápida -
militares que podem chegar a qualquer lugar do país em poucas horas.
A idéia será dotar o Exército de maior mobilidade e flexibilidade. Em
resumo, fazer com que todo o contingente tenha capacidade de mover-se
rapidamente, sem núcleos especializados de elite. Pode haver
realocação de pelotões e brigadas, mas o essencial será a rapidez no
deslocamento. "O problema não é ter um patrulheiro em cada ponto do
país", observou Mangabeira, reconhecendo, sem especificar valores, que
a idéia a ser proposta exige um salto orçamentário para o Exército.
Para a Marinha, o programa de reaparelhamento terá como prioridade
inicial a "negação do mar", disse o ministro - essencial, segundo ele,
para garantir proteção, por exemplo, às plataformas de petróleo em
alto mar. Os maiores esforços estarão concentrados na conclusão do
submarino nuclear brasileiro, que levará mais sete ou oito anos. O
equipamento é considerado fundamental para aumentar o poder
dissuasório da Marinha. Também serão reformados os submarinos
convencionais. Para a parte não-nuclear dos submarinos, deve ser
fechada parceria com a França e criada uma empresa binacional.
Mangabeira disse que a FAB "deverá renovar sua frota de aeronaves de
2015 a 2025 e o Brasil não poderá ter um hiato de falta de proteção
aérea". No início das discussões, o governo debateu com a Aeronáutica
duas alternativas: comprar caças de quarta geração, tentando negociar
transferência de tecnologia, ou buscar o desenvolvimento de um avião
de quinta geração com alguma potência bélica. Evoluiu-se em seguida
para duas "soluções híbridas" e o plano a ser anunciado em 7 de
setembro provavelmente mencionará uma delas. Ambas envolvem o que se
chama no jargão aeronáutico de "quarta geração plus".
Ou seja, aviões de ponta - como o russo Sukhoi Su-35 Flanker, o sueco
Gripen NG, o francês Dassault Rafale, o europeu Eurofigther e o
americano F-18 Super Hornet. Há algumas semanas, a FAB deu o primeiro
passo e entregou correspondência aos países fornecedores em busca de
informações e cotações de preço para detonar o projeto F-X 2. Na
primeira hipótese, o Brasil se colocará como candidato a parceiro para
desenvolver em conjunto tecnologias que faltem no futuro avião
escolhido pelo plano brasileiro. Por exemplo, aumentar o raio de ação
do caça ou aperfeiçoar sua capacidade "stealth" (de confundir os
radares inimigos).
Na segunda hipótese, comprará um número "limitado" de aeronaves,
exigindo transferência de tecnologia, com a abertura do código-fonte,
disse Mangabeira. Isso permitiria à indústria nacional, segundo o
ministro, desenvolver seu próprio supersônico. Ele reconheceu que
"seria ficção" imaginar uma solução que não passe pela Embraer.
Mangabeira se disse "aflito" por acreditar ainda não ter tido sucesso
em "convencer a nação" do projeto de reestruturação das Forças
Armadas. Ele sublinhou que o projeto é muito maior que o
reaparelhamento. Nas conversas com os representantes estrangeiros, o
ministro tenta deixar claro que "o objetivo não é comprar brinquedos
caros, num supermercado de caças e de submarinos, mas nos colocarmos
em uma trajetória de desenvolvimento tecnológico".
Mangabeira acrescentou não querer que essas parcerias se transformem
em algo meramente militar. Há projetos com a França para uma
tecnologia similar ao GPS americano e com a Rússia para um mapeamento
de patentes que estão registradas mundo pelo afora. São planos de alto
custo, mas "nada é mais caro do que ter independência nacional",
arremata o ministro extraordinário de Assuntos Estratégicos.
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