Um petista encrencado
Alvo da irritação de Lula, o ex-deputado Greenhalgh pode se tornar foco de uma nova investigação da PF no caso Daniel Dantas
David Friedlander e Ricardo Amaral
Revista Época - 29/07/08
Entre as conversas telefônicas captadas pela Polícia Federal na Operação Satiagraha, há um flagrante incontestável de tráfico de influência. Ele envolve o ex-deputado Luiz Eduardo Greenhalgh e um vendedor ambulante de churrasco na rua. “Onde eu moro, há muitos anos tem um rapaz que vende esses churrasquinhos de gato na esquina”, disse Greenhalgh a um homem identificado pela polícia como funcionário da Prefeitura de São Paulo. “Estão tirando as coisas dele... Se você pudesse agir para suspender essa operação. Os caras estão aloprados.” Os aloprados eram fiscais da Prefeitura, numa blitz para apreender mercadoria em situação irregular. O telefonema terminou com a promessa de que o protegido de Greenhalgh receberia suas “coisas” de volta.
A tentativa de aliviar a situação do churrasqueiro ambulante, flagrada no dia 6 de junho, um mês antes da Operação Satiagraha, pode ser apenas um lance folclórico perto do papel que a PF atribui a Greenhalgh no mundo dos negócios envolvendo o governo e empresas de telefonia. Na semana passada, o delegado Protógenes Queiroz despediu-se do caso com a entrega de um relatório de 152 páginas. Nele, Protógenes indicia 13 pessoas – entre elas o banqueiro Daniel Dantas e sua irmã Verônica – e recomenda uma investigação à parte sobre Greenhalgh. No relatório, Greenhalgh é chamado de “integrante do escalão especial” do grupo supostamente comandado por Dantas. Contratado pelo banqueiro por cerca de R$ 650 mil, Greenhalgh é acusado pela PF e pelo Ministério Público Federal de fazer lobby dentro do governo, no PT e na Anatel, com o objetivo de tornar viável a venda da Brasil Telecom para o grupo Oi-Telemar, um negócio que o governo deseja ver concretizado.
A divulgação do envolvimento de Greenhalgh com Dantas – tido como adversário do governo e do PT – irritou o Palácio do Planalto. Petista histórico e com vínculos igualmente históricos com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Greenhalgh foi apanhado por um grampo da PF quando pedia a Gilberto Carvalho, chefe de gabinete da Presidência, informações sobre a investigação sigilosa em torno do Opportunity de Dantas. A amigos que pediram explicações, Greenhalgh disse que aceitara a conta do Opportunity depois de consultar Lula e receber seu aval, como antecipou ÉPOCA em suas duas últimas edições. O presidente Lula tem reclamado da versão divulgada por Greenhalgh. “Ele não tinha nada que sair por aí dizendo que agiu com autorização do governo. O governo não autorizou nada”, disse Lula numa conversa com ministros.
Na semana passada, Greenhalgh divulgou uma nota em que confirma ter trabalhado na venda da Brasil Telecom para a Oi-Telemar. Ele afirma ter atuado como advogado, não como lobista. Assessores ligados a ele disseram a ÉPOCA que, na negociação, Greenhalgh ajudou a resolver as disputas judiciais entre Dantas e seus sócios na Brasil Telecom, principalmente o Citigroup e os fundos de pensão de empresas estatais. O acerto era necessário para que Dantas vendesse sua participação na Brasil Telecom, o primeiro passo para que a fusão com a Oi-Telemar deslanchasse.
Em pelo menos duas conversas com aliados, o presidente Lula procurou marcar distância entre o governo e Daniel Dantas. Lula pontuou as duas conversas com críticas pesadas ao banqueiro, a quem chamou de “mau caráter”, “cretino” e “escroque”. Numa das conversas, afirmou ter proibido o consultor Antoninho Marmo Trevisan de intermediar um negócio entre a Gamecorp de seu filho Fábio, o Lulinha, e a Brasil Telecom, então comandada por Dantas. “Quando o Toninho Trevisan me disse que a empresa era do Daniel Dantas, proibi. Falei que fizesse o negócio com qualquer um, nem que fosse pela metade do valor, mas com esse sujeito, não”, disse Lula. Lulinha parece ter seguido o conselho do pai. Sua empresa se associou ao grupo Oi-Telemar, o mesmo que está sendo apoiado pelo governo para comprar a Brasil Telecom.
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